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Crônicas de Rodrigo Bender Dorneles

Crônicas de Rodrigo Bender Dorneles

Rodrigo Bender Dorneles é Bacharel em Administração. Administrador poeta e cronista. Trabalhou no agronegócio da família, e na CESA, Camaquã (RS). Mora atualmente em Porto Alegre, onde seguiu caminho profissional na área comercial.
Trabalha hoje como consultor de negócios em uma empresa de Assessoria tributária.
Filosofo de final de semana. Amante de história, sociologia e filosofia.

“Não somos aquilo que fizeram de nós, mas o que fazemos com o que fizeram de nós” (Jean Paul Sartre)

16/05/2021 - 14h58min Rodrigo Bender Dorneles / Foto: Divulgação

A sociedade humana funciona pelas variáveis criadas socialmente, dentro das variáveis físicas da lei da natureza. O ser humano transcende o animal não apenas pela inteligência, mas pela sua capacidade de tomar decisões.

Somos individuais e aquilo que fazemos cotidianamente a partir de nossas decisões. Somos intelectualizados, mas a materialidade que nos faz humanos.

Ou seja, não apenas penso, logo existo, mas sim ajo e logo existo. O pensamento precede o ato, e os atos criam novos pensamentos.

Somos as decisões que podemos ter, dentro de nosso contexto de vida, seja cultural, familiar, de trabalho, de País. Somos baseados numa história única e envolvidos pela lei da ação e reação, dentro de nossas infinitas possibilidades de ser e estar.

Somos o que podemos ser, dentro de critérios humanos e o que nos guiam são os estereótipos.

A sociedade funciona, desde o início, baseada em estereótipos, quanto mais complexa a sociedade maior o número de estereótipos.

Basicamente, a existência precede a essência como dizia a teoria existencialista do filósofo Jean Paul Sartre. Ou seja, a partir de nossa existência, de nossos atos e capacidades ocupacionais somos colocados em caixas como se dessa forma verificassem nossa essência.

Vou explicar:

Desde a antiguidade, formulamos estereótipos e definimos essências. Assim o Rei se torna Rei, o sábio se torna sábio, o louco se torna louco, a prostituta se torna prostituta, e o ladrão se torna ladrão.

Não que tenhamos nascido desse modo, mas ao longo da vida através de nossas escolhas, existimos de tal modo a nos tornarmos, a partir da visão social, um ser estereotipado.

Assim, o louco é essencialmente louco, o sábio essencialmente sábio, o padre essencialmente padre, enfim...

De forma simplista, o Leão na natureza é exatamente da forma que deveria ser, pouco se distingue o leão de outro. O macaco da mesma forma, a banana é também perfeita na sua existência. Mas o humano não, o humano se torna aquilo que ele faz com o que fazem dele.

Quando criança comecemos a explorar o mundo e fazer nossas escolhas até que mais velhos somos encaixados de alguma forma em um enquadramento.

Não que não seja um processo mútuo de interação, não que não seja complexo, tendo cada pessoa um estereótipo diferente em cada relação que exerce, mas obviamente um estereótipo maior é criado a partir de nossa persona.

Persona para Carl Jung, psiquiatra contemporâneo de Freud, é basicamente e simplistamente o personagem que criamos em cada relação que vivemos.

Estereótipos servem também para nos protegermos e esperarmos previamente a ação do outro.

Quando convivemos com alguém que tem o estereótipo de louco, já nos preparamos pra identificar loucuras, com o burro para identificar burrice, para o sábio sapiência, para a prostituta atos sedutores e libidinosos. E para o ladrão, logo trocamos o lado da rua onde caminhamos pois nós fizemos ao olhar uma avaliação do perigo.

Este é o início e o fim de todo preconceito.

E também o modo sincrônico como convivemos em sociedade, e principalmente como convivemos com aqueles que não são tão próximos.

As relações íntimas propiciam o entendimento e aceitação, pois vemos no outro complexidade e suas nuances.

Nas outras relações em geral, temos uma fábrica de caixas.

E todos os dias encaixamos as pessoas, isso é tão natural quanto perigoso.

Assim os preconceitos são criados, assim queremos status, um trabalho, uma reputação que nos permita ser feliz no convívio humano, pois isto é tão importante e necessariamente humano, como se alimentar e procriar.

Nascem dessa forma as normas de etiqueta de cada cultura, o jeito de se portar em grupo, e o modo peculiar de agir de cada tribo humana em cada local do Planeta terra.

O negro no passado foi estereotipado como um ser sem alma para igreja Católica, Um ser que apenas servia para o trabalho e para servir. O Gay foi estereotipado como pervertido. A boa mulher foi estereotipada como recatada e do lar.

O comunista como preguiçoso, o liberal como egoísta. O ateu como individualista e o religioso como inocente.

Até Jesus, o maior líder do mundo ocidental que teoricamente transcendeu o humano e virou Deus, estava sendo crucificado ao lado de ladrões e criminosos.

Graças a Deus, ou melhor graças a ele, ele ressuscitou e mostrou ser o Messias. Graças a Deus, ele mostrou ser quem é.

Se não teríamos apenas mais um rebelde crucificado pelos Romanos e não nosso Salvador que está para voltar.

Como mudar isso, se é algo tão natural?

Podemos mudar através da luta incessante, incansável, e cotidiana.

Por isso, precisamos lutar contra o racismo e colocar o Negro na posição igual ao branco, lutar para o fim da homofobia, do machismo, da psicofobia.

Enfim, isso é um processo demorado e feito por vários agentes sociais, um trabalho realizado no passado, que deve ser massivamente trabalhado no presente para termos um mundo maior no futuro.

A semente deve ser plantada hoje para que nossas crianças se tornem o que quiserem ser, sem julgamentos de cor, de credo, de sexo, enfim.

Plantar a semente hoje e trabalhar para cultivar este projeto, é uma chance que temos de acabar com a indústria de caixas.

Na política no Brasil, hoje, temos duas caixas: de um lado um mito de outro um ladrão. Na sociedade com a pandemia duas caixas: os negacionistas sem máscara que querem trabalhar. Do outro lado, os mascarados que querem fechar todo o comércio e se vacinar.

No mundo, os chineses perversos que criaram o vírus.

Será que as coisas não são mais complexas?

Claro que fui maniqueísta e um tanto irônico ao construir minha tese.

Não seria melhor um mundo menos quadrado?

Não seria melhor termos caixas mais personalizadas?

Não seria melhor acabar com isso?

Talvez seja mais fácil encaixar do que refletir.

Talvez não somos o que queremos ser.

Talvez não somos o que fizeram de nos.

Mas talvez somos o que fazemos com o que fizeram de nós.

Mas qual caixa você quer ser?

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