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Crônicas de Rodrigo Bender Dorneles

Crônicas de Rodrigo Bender Dorneles

Rodrigo Bender Dorneles é Bacharel em Administração. Administrador poeta e cronista. Trabalhou no agronegócio da família, e na CESA, Camaquã (RS). Mora atualmente em Porto Alegre, onde seguiu caminho profissional na área comercial.
Trabalha hoje como consultor de negócios em uma empresa de Assessoria tributária.
Filosofo de final de semana. Amante de história, sociologia e filosofia.

Então, Deus criou o mal

10/01/2022 - 15h50min Rodrigo Bender Dorneles / Foto: Depositphotos / Direitos Reservados

No início nada existia. O nada vasto sem matéria permeava o todo.

Nada existia? Nada existia. E Deus criou todas as coisas? Sim, Deus criou tudo que existe?

Sim. O bem e o mal existem?

Sim.

Então Deus criou o mal!

O conceito do bem e do mal e toda a sua complexidade, e reflexão sempre permearam o pensamento da espécie humana. Talvez, tenham sido criados pela nossa racionalidade como uma função vital para a vida em sociedade, ou talvez, sejam da natureza dos fatos do universo e espaço - tempo.

O que sabemos é que somos seres que pensam em suas ações. Que escolhem as suas atitudes e que de alguma forma, sentimos algo, mesmo que bioquímico entre neurotransmissores, mas algo em que podemos sim acreditar que existe, pelo menos, o conceito entre o bem e o mal.

A filosofia ética surgiu na sociedade como a reflexão sobre as condutas, e se tornou tão complexa quanto a evolução social humana. A ética criou condutas, a ética criou regras, o Direito, leis. O bem e o mal foram relativizados pela reflexão ética de cada cultura.

A possível vida em sociedade, desde as mais primitivas até as mais elaboradas passa pela reflexão sobre nossas ações.

Sigamos com o raciocínio:

Em tese partindo pela lógica ateísta podemos sim considerar que o Big Bang deu origem a tudo que existe. A matéria, a luz, aos átomos.

Pelo niilismo filosófico, podemos inclusive suscitar que a ética é apenas a forma humana de perpetuar a espécie humana e, por conseguinte a vida em sociedade. A ética seria o continuar de qualquer evolução Darwinística, seguindo como um instrumento social ocasionado pelas leis da ação e reação, criado por uma espécie que necessita da moral como fonte de organização social.

Pela lógica bíblica, podemos entender as coisas por ângulos menos céticos.

“No início só existiam trevas, e Deus criou a luz, só existia a ausência, e Deus criou a sua semelhança o ser humano”.

Sigamos com as duas linhas de raciocínio. A teológica e a cética científica.

Supostamente, pelos cientistas chegamos em um ponto histórico a entender que só existe o calor.

O frio seria a ausência de calor. Podemos medir o calor, mas não podemos medir o frio. Podemos medir a luz, mas não podemos medir a escuridão.

Podemos então entender o Bem como o oposto do mal, o exato oposto com proporcionalidade em direções contrárias.

Ou podemos comparar o Mal como a ausência do Bem criando a noção entre apenas uma grandeza e sua ausência, assim como a ciência define a ideia de calor e frio.

Podemos seguir esta premissa, mas na linha teológica, podemos entender de outra forma:

Por uma linha teológica, só existia o Bem. Existiam apenas Deus e os anjos. Apenas a perfeição e a bondade. Deus então quis criar uma assembleia e convidou todos os anjos. Deus queria criar a espécie humana. Ele queria criar o livre arbítrio. Poderíamos ter escolha sobre amar a Deus e o seguir sem reflexão. Ou, sermos ausentes, negligentes, e sem o amor intrínseco.

Lúcifer, o anjo mais bonito e que voava mais alto, queria a autocracia da admiração ao bem. Queria que só existissem os bons, e principalmente admiradores dos anjos e de sua perfeição.

Os votos dos anjos decidiram pelo livre arbítrio, decidiram pela independência.

O diabo, machucado em seu ego e fascinado pelo poder, convocou outros anjos, e a rebelião começou. Uma guerra nos céus, contra Deus, o criador.

Lúcifer e os anjos traidores, caíram na terra pelo poder Divino. Assim se originou a maldade. Do fascínio ao poder veio as trevas, e quase que ironicamente, a profecia do livre arbítrio foi estabelecida.

O que é o bem e o mal, então?

Será que só existe um se existir o outro? Será que o bem para ser bem precisa ser escolhido?

Este paradoxo sempre vai permear a reflexão humana.

Deus criou o mal, ou apenas ele o permite? Deus criou os anjos e a, transgressão pelo poder que criou o mal?

Se temos um filho, de quem é a responsabilidade para com suas ações? Sendo ele potente e capaz, não será o mesmo capaz de tomar suas próprias escolhas?

Enfim, mesmo que tudo seja um processo contínuo da evolução da matéria, passando pelo darwinismo e regido pelas leis da física, estamos no meio do processo infinito da evolução do universo.

Sim o bem, o amor, e tudo que sentimos pode ser fruto desta evolução contínua, com regras preestabelecidas pelas leis da física, num processo que anda sem nenhum julgamento e juízo de valor.

O amor pode sim apenas existir como uma necessidade de uma função social.

Mas, podemos acreditar que não. Podemos na ética encontrar a virtude, e ver o que significa cada decisão. Mesmo que impotente, mesmo que minúscula no universo.

Parece que acreditar no paradoxo ainda nos torna humanos, e que se Deus ainda permanecer vivo, pelo menos em nosso imaginário, vale a pena pelo que viver, lutar, escolher.

O bom não é aquele que toma boas ações e atitudes sem optar ou sem conhecer a maldade.

O bom não é o que nunca foi tentado.

O bom é aquele que, mesmo no vale das sombras, tentado mais de mil vezes, ainda assim escolheu a virtude. O bom é o pérfido que conviveu com as sombras, mas soube ver a luz.

Aquele que escutou o mal e aprendeu a conviver com ele, sem se corromper. O bom é o que caminhou no vale da perdição, munido apenas de exemplos ruins, corrompido em valores, mas que soube ver a luz por uma escolha em que não buscava benefícios, mas a retidão contemplada sem a moeda de troca.

Jesus não ensinou apenas no exemplo, Jesus ensinou ao sangrar.

Deu a própria vida e materializou a dor.

Foi no seu ato da crucificação que o complexo se tornou simples, e que podemos entender pela nossa própria experiência, o significado da bondade.

Ele materializou para tornar explícito.

Foi crucificado entre ladrões e bandidos.

A ética é uma das coisas mais complexas, é dela que se tiram as leis. É só por ela que existe a sociedade humana, a tecnologia, a saciedade de nossas necessidades.

Podemos sim ser apenas obras do acaso.

Mas ainda que perigoso, ainda que difícil, ainda que sufocante.

Viver é escolher entre as duas vozes.

Não, não. Deus não criou o mau.

Será que foi a humanidade? Será que apenas criamos o conceito?

“Paz na Terra aos homens de boa vontade”.

Foto: Depositphotos / Direitos Reservados

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